O ordenamento jurídico proíbe a capitalização mensal de juros em contratos de compra e venda de imóvel firmado com pessoa jurídica que não integra o Sistema Financeiro Nacional. Por outro lado, a jurisprudência autoriza a aplicação do Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M) em contratos do tipo.
Esse foi o entendimento aplicado pela 5ª Turma da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) para afastar a capitalização mensal de juros e manter a correção pelo IGP-M em um contrato de compra de imóvel assumido por um banco.
Segundo os autos, um consumidor financiou a compra de um imóvel no valor de R$ 199,5 mil diretamente com a construtora. Posteriormente, a construtora cedeu ao banco os créditos referentes à escritura. Ocorre que, ao longo do financiamento, a instituição financeira incluiu no contrato a cobrança de um seguro e de juros capitalizados mensalmente. Além disso, aplicou o IGP-M ao calcular a correção monetária.
Alegando que as cobranças eram abusivas, o comprador pediu que a Justiça afastasse os encargos. O juízo de primeira instância, porém, entendeu que houve venda casada de seguro obrigatório e anulou apenas essa cláusula do contrato. O comprador recorreu, mas a decisão foi mantida.
Ainda insatisfeito, o consumidor ajuizou apelação cível pedindo a reforma da sentença. Entre as alegações, ele sustentou que o banco não poderia ter incluído a capitalização mensal de juros, já que o credor originário da compra era a construtora, e não a instituição. Nesse sentido, uma perícia contábil mostrou que apenas o afastamento da capitalização reduziria em R$ 250 mil a dívida cobrada pelo banco, segundo o advogado Rafael Bispo da Rocha Filho, que representou o comprador.
Por fim, o comprador alegou que o banco agiu de forma abusiva ao usar o IGP-M durante a crise da Covid — período em que o índice sofreu aumento significativo — e pediu a devolução em dobro dos valores pagos. Já o banco apontou a improcedência dos pedidos.
Relator do caso, o desembargador Delintro Belo de Almeida Filho iniciou sua fundamentação citando o artigo 5º da Medida Provisória 2.170-36/2001. O dispositivo autoriza a capitalização mensal de juros nas operações feitas pelas instituições que integram o Sistema Financeiro Nacional. O relator reconheceu, porém, que a permissão não alcança os contratos de compra de imóvel firmados entre construtora e comprador — caso da aquisição descrita nos autos.
Dessa forma, como a construtora da unidade não compõe o Sistema Financeiro Nacional, “a cobrança de juros capitalizados mensalmente é vedada, sendo permitida apenas a capitalização anual, de acordo com o artigo 4º do Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933”, explicou o desembargador.
Ele acrescentou que o Código de Defesa do Consumidor também determina a nulidade de cláusulas contratuais que impõem desvantagens exageradas ao consumidor, como a que se verifica no caso. Já em relação ao pedido de substituição do IGP-M, o relator afirmou que parte majoritária da jurisprudência entende que o índice de correção é amplamente utilizado em contratos imobiliários similares ao dos autos.
Assim, “mesmo que tal índice de correção haja atingindo uma valorização anual surpreendente em 2020 (durante a crise da Covid), não há se alegar que tal fato acarretou onerosidade excessiva, nem que a pandemia pode ser enquadrada como fato extraordinário e imprevisível”, disse o desembargador. Por fim, ele ordenou a devolução em dobro do valor pago de forma indevida pelo comprador após 30 de março de 2021. A decisão foi unânime.
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Apelação Cível 5036806-32.2021.8.09.0051
Wilson Tavares de Lima - OAB/MS 8290
R. Nelson Figueiredo Júnior, 779 - Vila Antonio Vendas, Campo Grande - MS, 79003-160